China proíbe influenciadores sem diplomas

Essa moda pega aqui?

De
Pesquisador Paulo Marcelo
Jornalista, Intelectual Público, Pesquisador, Comunicador, Fotógrafo, Professor, Palestrante, Designer e Busólogo.

A ascensão dos influenciadores digitais transformou profundamente a forma como a informação circula no mundo. O que antes era monopólio de especialistas e instituições agora é mediado por vozes independentes, muitas vezes carismáticas, mas nem sempre qualificadas. Essa democratização do discurso, ainda que revolucionária, trouxe também um problema de escala global: a desinformação. É nesse contexto que surge uma medida polêmica adotada pelo governo chinês.

A China anunciou novas regras para influenciadores e criadores de conteúdo, exigindo diplomas e qualificações verificáveis para quem quiser abordar temas considerados profissionais, como medicina, direito, finanças, educação e saúde. Plataformas como o Douyin (versão chinesa do TikTok) e o Weibo serão responsáveis por verificar as credenciais dos usuários. Quem descumprir as normas poderá enfrentar multas que chegam a 100 mil yuans (cerca de €13 mil), além de suspensão ou fechamento da conta.

O argumento oficial é claro: combater a desinformação e elevar o padrão de qualidade dos conteúdos compartilhados. No entanto, a medida reacende um dilema global — onde termina a proteção da sociedade e onde começa o controle do discurso?

Regulamentar não é censurar — mas pode se tornar

A fronteira entre responsabilidade e censura é tênue. Regulamentar o espaço digital é, em muitos aspectos, necessário. Afinal, vivemos uma era em que uma postagem pode provocar pânico financeiro, desconfiança médica ou polarização política em questão de horas.

Mas quando o Estado assume a prerrogativa de determinar quem pode ou não falar, a linha que separa o combate à mentira do silenciamento da pluralidade começa a se desfazer.

A China é conhecida por seu rígido controle sobre a internet, o que torna a medida mais sensível. Lá, o monitoramento estatal já se estende a temas considerados “de interesse público”, o que inclui política, religião, economia e direitos humanos. Assim, ao condicionar o direito à fala à posse de um diploma, o governo também cria um filtro ideológico disfarçado de critério técnico.

O desafio da credibilidade nas redes

Apesar das controvérsias, a proposta toca em um ponto crucial: a credibilidade da informação digital. A lógica do engajamento — que recompensa quem gera reações, não quem informa com precisão — corroeu a confiança nas redes. Profissionais formados são, muitas vezes, suplantados por influenciadores sem preparo, mas com domínio das narrativas emocionais e do algoritmo.

É sintomático, por exemplo, que milhões de pessoas busquem diagnósticos de saúde em vídeos curtos, orientações jurídicas em perfis de humor ou conselhos financeiros em trends do TikTok. A fronteira entre o conhecimento técnico e a opinião informal tornou-se difusa, e o risco de erro — coletivo.

Nesse cenário, a exigência de comprovação de competência surge como resposta à crise de autoridade do conhecimento. Mas ela também levanta a pergunta: quem certifica o certificador?

Se apenas diplomas valem, o que acontece com saberes empíricos, comunitários, indígenas ou populares? A medida, embora bem-intencionada, pode acabar reforçando hierarquias sociais e excluindo vozes que não têm título, mas têm experiência legítima.

Entre o caos informativo e o controle autoritário

O mundo vive um impasse: deixar o espaço digital completamente livre levou a uma epidemia de fake news e discursos de ódio; mas submetê-lo a um controle centralizado ameaça o pluralismo.

O caso chinês é um espelho extremo desse dilema. Ele revela que a busca por ordem informacional pode facilmente escorregar para a vigilância do pensamento.

A solução talvez não esteja em restringir o direito de falar, mas em valorizar o direito de aprender — fortalecendo a educação midiática, a alfabetização digital e o espírito crítico da população.

Em vez de calar vozes, é preciso ensinar as pessoas a ouvir com discernimento. Em vez de punir o erro com censura, deve-se construir uma cultura que premie a precisão, a ética e a responsabilidade no uso da palavra.

Conclusão: a voz pública e a era da responsabilidade

A decisão chinesa inaugura um novo capítulo na relação entre influência e legitimidade. Ela traz uma pergunta que não se limita à Ásia: quem tem o direito de falar com autoridade nas redes?

O diploma pode garantir conhecimento técnico, mas não garante ética, empatia ou compromisso com o bem comum. A internet, por sua natureza, é um espaço de múltiplas vozes — e talvez o maior desafio do nosso tempo seja encontrar um equilíbrio entre liberdade e responsabilidade, entre autenticidade da fala e veracidade da informação.

Em tempos de excesso de ruído, não basta falar alto — é preciso falar certo, com base, consciência e responsabilidade.

China regulamenta influenciadores
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Jornalista, Intelectual Público, Pesquisador, Comunicador, Fotógrafo, Professor, Palestrante, Designer e Busólogo.